sexta-feira, 26 de dezembro de 2008

Testamento amoroso

Quando eu morrer, só quero sorrisos.

As lágrimas, se escaparem, liberem-nas no jardim para que possam estimular as flores, beleza máxima da vida com sua forma e não-forma (cheiro). Como amo as flores.

Quando eu morrer, só quero poesia.

As lamentações não são justas com a dádiva da vida, essa oportunidade máxima de prática cotidiana e evolução espiritual de nossa mente-coração. Como amo a vida.

Quando eu morrer, só quero 'até logo'.

O 'adeus' torna o tempo ao reencontro demasiadamente longo e não há tempo e espaço entre os portões da vida - nascimento e morte - que tornam difícil a tarefa do Amor de reunir os que são afim. Como amo vocês.

Quando eu morrer, leve meu Amor à todos, sem exceção. Nada mais tenho senão o melhor de mim para d(o)ar. Como Amo.

Escrito no natal de 2008 sob inspiração da passagem de meu Opa, reflexões sobre minha própria morte e sensação de ressurreição. Que todos possam se beneficiar.

No Amor,

segunda-feira, 22 de dezembro de 2008

Três Coroas para um só coração

Do dia 05 ao dia 10 de dezembro de 2008 passei ensolarados e maravilhosos dias no templo budista Khadro Ling, em Três Coroas/RS para participar da consagração do templo de Guru Padmasambhava - mestre indiano budista que levou o budismo ao Tibete no século VIII.

As bênçãos eram inúmeras e claras: afinal, parou de chover um dia antes e voltou a chover um dia depois das cerimônias. No ápice do ritual de consagração até as bandeiras pararam de tremular: no topo da montanha onde sempre venta, imaginem, o vento havia parado para se curvar em homenagem. O Sol, astro-rei, literalmente coroava o céu acima e nós abaixo.

É o poder de muita meditação e mantras, com grande enfoque no Buda da Compaixão, Cherenzig, sempre acompanhados pela canção de belos pássaros.

Eis que em um belo entardecer, entre os inúmeros que presenciamos, minha lente capturou esta amorosa emanação do Sol que nos aquece, nutre de vida e envolve de Amor.


Essa é a moral da história: quando entramos em contato com nosso Eu interior e em sintonia com a natureza ao nosso redor, o Amor é o elo de ligação e destino final dessa jornada que é a vida, que em si nada mais é que o exercício de Amar e assim a alma cultivar.

OM Amor,

sábado, 20 de dezembro de 2008

A real fábula kafkaniana da barata e do amor, a aplicação prática das quatro incomensuráveis budistas

Quando completei 31 anos, no dia 26 de novembro de 2008, fiz votos de não matar, tampouco me nutrir de nenhum ser vivo com sistema cognitivo desenvolvido: passaria o dia mais vegetariano do que nunca, reforçando a escolha que fiz há quase 3 anos e que tenho ainda maculado com esporádicas aberturas para a ingestão de peixes e frutos-do-mar - fugindo-me à culpa pela frágil retórica de que são frutos e de que tanto biológica quanto zodiacalmente falando Peixes não sentem dor e são doadores, além da fecundação ser realizada de maneira externa e não se criarem cuidados parentais.


Então solicitei que minha mãe fizesse o macarrão ao funghi ao invés do macarrão ao camarão, bem como evitei os encontros no japonês e na temakeria.


Quando à noite tomava meu banho fui confrontado com uma situação kafkaniana: uma barata me observava audaciosamente perto de meus utensílios de higiene, tais como escova-de-dente, barbeador e demais apetrechos masculinos.


A primeira reação, por mais que tenha sido apenas um lampejo, foi a óbvia e habitual reação egóica de revolta por um bicho ligado comumente à sujeira estar perto de minha higiene pessoal.

Sentença: a m... não, peraí! Não poderia lhe desejar a morte. Não poderia esmagá-la assim, sem mais, nem menos. Havia feito votos de não matar seres em meu aniversário - ao menos não deliberadamente, pois andando na rua vitimizamos insetos suficientes para ainda o fazermos de maneira assim, cruelmente premeditada.


Contemplei. A barata. Meu voto. A situação.


Constatei que não havia diferença entre a barata e o camarão - inclusive são iguarias igualmente apreciadas em certos recantos do mundo.

Constatei ainda que o revisteiro abaixo da pia estava com jornais velhos, bagunçado e servia de refúgio para seres como aquela barata que tanto me fazia confrontar com velhos hábitos: não optamos todos pela saída mais cômoda, por permanecermos em nossa zona de conforto?


Tentei tirá-la, mas na primeira tentativa ela caprichosamente correu para debaixo e para dentro do tal revisteiro, que na verdade havia percebido somente naquele momento de sua fuga.

O pensamento de 'f.d.p., olha a trabalheira que está me dando' rápida, gentil e compassivamente cedeu vez para um agradecimento genuíno pela possibilidade e incentivo para organizar e limpar o revisteiro; basta mudarmos nossos paradigmas e tentar enxergar por uma ótica amorosa, de eterno aprendizado e benefício contínuo.


Dito e feito. Foi tirar o último exemplar que ela apareceu e ficou imóvel. Levei o revisteiro até a janela. Bati forte e ela caiu para fora. Mas não é que a danada voltou e parou me encarando?


Retribui o olhar, dizendo a ela que ela estava indo para o lado errado, que desse meia volta e fosse para fora. Prontamente ela se virou e seguiu seu caminho para o mundo, como se tendo apenas voltado para agradecer.


Ao retirar o revisteiro, devo ter batido no cifão da pia, pois pela manhã havia uma mancha na bolsa de minha máquina de raspar cabelo. O formato, imaginem: um perfeito coração.





Incrível do que a força do amor e da compaixão são capazes, não?

Depois disso fui visitado mais uma vez por uma barata que foi facilmente conduzida para fora sem retornar.

Adendo: minha relação com os mosquitos segue o mesmo caminho. Não os mato mais há um bom tempo, mas combato sim os possíveis focos de surgimento. Ah sim, não costumo ter uma mordida de mosquito!

Moral da história

Através do amor podemos não apenas entender o outro, o diferente, como também respeitá-lo e respeitar nossa natureza, fazendo com que nossas ações sejam construtivas de fato e em todos os sentidos.

Atuando com amor, preservamos os espaços e melhoramos não apenas a vida alheia, mas principalmente a nossa vida. Passamos a condenar menos os outros e também menos a nós mesmos, nos ofertando a possibilidade e o espaço para transcendermos e, ao passar pela zona de conforto de maneira amorosa, organizar e limpar recantos de nosso ser que acumulavam poeira e ficavam à sombra de nosso brilho, por muito tirando-nos nossa leveza e alegria de viver.

Às vezes, algo aparentemente negativo pode ser trabalhado como suporte positivo, basta termos calma para não sermos reativos/raivosos a partir de nosso ego e sim agirmos amorosamente com a plenitude de nosso ser.

O importante é sempre questionarmos se não poderiamos fazer, mesmo e principalmente as coisas mais simples e banais, de maneira diferente. No mínimo, faz-se necessário pensar diferente e questionar nossa maneira de ver e lidar com o mundo - os atos serão conseqüência dessa reflexão.

A receita budista para cultivar o amor é se trabalhar a equanimidade, conquistada por sua vez pela renúncia ao dualismo e a diferenciação; pela intenção de praticar o bem e que todos sejam afortunados - bodhicitta; pela realização da vacuidade, de que todos os fenônemos são vazios de existência e sim determinados por sua posição no tempo, espaço e relação interdependente; e, por fim, da aceitação da inexistência de um Eu, que igualmente é dependente do tempo, espaço e de suas relações.

Assim se cultiva o amor, que leva à compaixão e, por fim, ao regozijo.

Quando se sente a felicidade verdadeira de ver um ser livre, mesmo que momentaneamente como no caso da barata, de vê-lo feliz e sentir-se feliz pelo outro, isto é o ápice de nossa existência e potencializa essa coordenada no tempo, espaço e relação/conhecimento que chamamos de Eu - uma parte ínfama da grande rede que é a vida.

Depois de experimentar o prazer que é sentir prazer pelo prazer do outro, passa-se a querer trabalhar incessantemente para que esta felicidade seja genuína e imutável, ou seja, que esse ser também se liberte - porque nesse momento, você já estará liberto, já terá despertado.

É o Amor que desperta, eterniza e faz esse pontinho brilhar.

Aproveito para agradecer ao monge Gabriel pelos preciosos ensinamentos sobre as quatro qualidades incomensuráveis.

No Amor,

quarta-feira, 3 de dezembro de 2008

Amor, vida, diferença

A vida é o Tempo que se tem para se fazer a diferença. E o Amor o catalisador deste processo.

No Amor,

Amor, vida, movimento

Vida é movimento, movimento da alternância, nascimento e morte, pensamento e (emo)ação, sol e lua.

Amar é compreender a alternância e o movimento como um Todo, que por mais que se ame o dia e o sol, não tem como não se amar a noite e a lua, pois um define, dá forma e completa o outro - como o amor o faz com dois indivíduos, seres distintos que se unem por amor e assim se completam, quer seja sexualmente, corporativamente, intelectualmente: é a união de não-iguais, pois nada é igual.

E a capacidade de cooperação é este amor que viabiliza unir dia e noite, homem e mulher e tantos outros elementos distintos, mas amorosamente convergentes: com sabedoria, tudo converge ao equilíbrio (através do amor, sabedoria-mor).

Amar é viver plenamente tanto o dia quanto a noite, o nascimento quanto a morte, é viver a plenitude da possibilidade de cada momento - máximo dentro de cada limitação -, é viver na plenitude da graça divina o seu destino com toda sua vontade, pois amar é pleno.

Amar é estar aberto ao segundo seguinte, ao próximo ciclo, ao novo, ao outro, ao momento de renovação - sem se cansar do momento presente, vivendo-o plenamente.

No Amor, a plenitude do Ser, pois quem ama não sente medo, não sente inveja, não sente nada além de boas vibrações e um sentimento de pertencimento a algo maior, pois o religare (reunião) foi (re)estabelecido com o Todo,

Amor - não isolamento

Amor é o religare que tira o Eu do isolamento e o une ao Todo em uma abertura sem preconceitos que une tudo e todos, respeitando as diferenças a partir da igualdade de existência e respeito à vida.

No Amor,

Amor - enzima catalisadora do Ser

Amor é a enzima catalisadora, o (quinto) elemento que nos falta para que a raça humana se torne a super-raça, o super-organismo individual-coletivo - tal qual uma colméia -, o Übermensch (super-homem nietzschiano) que transcenderá o 'eu quero' egóico inicialmente para o 'você tem que' submisso a dogmas até encontrar sua liberação no 'Eu quero' do Ser/Eu superior e pleno em um amoroso processo de metamorfose da superação e divinificação de nosso lado animalesco, tal qual Nietzsche nos via no estágio da evolução, apenas uma etapa entre o animal e o super-homem, belissimamente retratado no clássico 'Assim falou Zaratustra'.

Amor, enzima que criptonita alguma pode enfraquecer, que força alguma pode deter.

No Amor,