sexta-feira, 22 de agosto de 2008

Será o Amor o passo para o supra-humano?

Será o amor diferente para o homem e para a mulher?

Será que o forjar pré-histórico de nossas diferenças socio-culturais-comportamentais que ressaltaram as distintas características biológicas - 1 óvulo X milhões de espermatozóides; produção única X constante produção - nos levaram a maneiras tão discrepantes de amar?

Será que o fato dos homens ficarem à época na caça, fora da caverna, atentos à presa e aos predadores, no misto alerta de medo e coragem de perder o que lhe era precioso - aguçando a visão, audição, faro e instinto 'caçador-matador' - faz com que os homens apenas lidem com o amor como uma mera conquista que resulta em posse? E que tudo se baseia no estímulo visual?

E será que o fato da mulher ficar no escuro da caverna, aguçando-lhe os demais sentidos antes que a visão, conferindo-lhe muito mais valor ao tato, ao olfato e à audição, potencializando sua capacidade de cuidar e deixando-lhe apenas com o medo do não-retorno do companheiro não fazem com que a mulher de hoje - apesar de estar cada vez mais com hábitos masculinos quanto o tocante é o sexo e o amor - ame à sua maneira: mais sentimento - afinal não era a 'perda', era quem perdia o ser amado; mais zelo; mais carinho; mais cuidado; mais calor humano - estava dentro da caverna, enquanto o homem vivia o frio exterior.

Lendo "Assim Falou Zaratustra", de Nietzsche deu-me que o Amor é a chave para o Supra-humano - o nietzschiano 'além-do-homem', comumente traduzido (erroneamente a meu ver) como super-homem e que é uma alusão ao Sol nascente além do horizonte como simbologia para a vitória - e o Supra-humano a realização desse amor, o alcance do divino-humano.

O Amor é o 'Sim' na capacidade do Supra-humano de dizer 'Não' ao "Você tem que": é a verdade e o verdadeiro "Eu quero".

Quando o humano se der conta da plenitude que é Amar universalmente e querer de fato Amar, tornar-se-à Supra-humano. O (verdadeiro) Amor (divino) no humano é o salto do macaco para o Supra-humano.

E o verdadeiro Amor é união e soma dos aprendizados de ambos os representantes da espécie humana, que deveriam amorosamente ensinar um ao outro sua forma de amar e evoluirem cúmplices neste aprendizado. Afinal, Amar também é conhecer, aceitar e aprender o desconhecido. É conquistar e se entregar, é se entregar e conquistar.

O 'lamentável' é que ao invés de se buscar a equiparação sexual nos aspectos positivos do outro, percebe-se uma derrocada do verdadeiro poder feminino que sucumbe quase por completo ao termos nossas mulheres embrutecendo para disputar o espaço que outrora era dos homens.

'Lamentável' entre aspas, pois talvez seja apenas o movimento natural que faça com que os homens - e já há alguns apontando este caminho -assimilem mais as boas características femininas. O movimento seguinte será o da mulher retomando seus valores e ficando com os aspectos positivos do universo masculino, sem se embrutecer.

O Amor unirá as diferenças dentro e fora de cada indivíduo e na sociedade como um todo.

No Amor, o tantra da verdade,

quarta-feira, 20 de agosto de 2008

Amor no infinito de nosso corpo e na eternidade de nosso Ser

Amar é esse sentimento de plenitude que transcende e expande, que sustenta e não acaba. A gente é que se esconde dEle e se sente só, quando na verdade estamos sempre em boa companhia.

Ao se entregar ao Amor, uni-se ao Todo e à todos, pois os sentimentos - alocados na barriga - e os pensamentos - localizados no cérebro - nos diferenciam, por muito distanciam, mas é o Amor o malgma que nos une, nos torna eternos e nos conduz ao infinito e além.

No Amor que forma o laço do infinito em nosso corpo, perpassando e unindo pensamento e sentimentos,

Amar é bombom demais

E foi em um desses bombons Serenata do Amor que veio a seguinte e verdadeira frase:

O verdadeiro amor nunca se desgasta, quanto mais se dá, mais se tem.

No Amor,

terça-feira, 12 de agosto de 2008

Compaixão em Spinoza: questão de conceito, essência do forte e emancipado

– um diálogo entre a compaixão em Spinoza, a compaixão cristã e a compaixão budista –
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Ao ler a Ética de Baruch Spinoza, confronta-se com uma oposição entre a compaixão – entendida como uma paixão, algo negativo que diminui nossa potência (em latim Spinoza optou por utilizar commiseratio, também traduzido literalmente por “comiseração”, que traz em si o radical inerente à palavra miséria, o que está longe de ser apenas uma mera coincidência) – e a vontade de ajudar ao próximo por decisões racionais e de vontade independente da situação em si, por achar proveitoso e positivo, algo que aumente a potência.

Spinoza faz uma clara e radical opção pelo termo commiseratio (comiseração) - ação de excitar a piedade - em detrimento de compassio (compaixão), em momento algum usado em sua obra – comunhão de sentimentos, sofrimento comum, compaixão, simpatia.

Não deixando dúvidas ao seu leitor, não usou o termo compassio, que poderia levar a um duplo sentido – o de confundir comunhão de sentimentos com o sofrimento (em) comum – e assim ficou livre para estabelecer a diferença entre o commiseratio e o fato de os homens agirem por sua natureza, de maneira virtuosa na preservação do ser zelando por si e pelo próximo em busca de tornarmo-nos uno em mente e corpo, no esforço conjunto da utilidade comum para todos, sendo justos, confiáveis e leais (E4P18E).

Demonstra-se assim a absorção oposta e complementar dos ‘conceitos-na-prática’ da compaixão por budistas e cristãos. Os budistas parecem adotar a compaixão como comunhão de sentimentos, o que não denota em si algo negativo, enquanto a compaixão cristã parece ser entendida pelo senso comum como o sofrimento (em) comum e que assim traz consigo claramente o aspecto da dor (e não necessariamente da solução, salvação) compartilhada – a dor por muito paralisa, apesar de também poder impulsionar, mas o risco de aquele minar este é muito alto de se correr. O termo grego sympathía (simpatia), evidencia, enquanto termos correlatos, o potencial positivo da compaixão.

Para Spinoza o forte e emancipado auxilia – ou deveria auxiliar, melhor dizendo - o próximo não por pena ou por culpa, sentimentos que o fariam se sentir menor em sua potência, mas por acreditar ser correto e assim pensar neste quesito de maneira construtiva, para edificar a solidariedade, a união e, portanto, somar forças e aumentar a potência, sua e coletiva. Spinoza substitui compaixão por ‘aquela atitude de ser justo, honesto e útil com outros homens pelo ditame da Razão’.

Neste sentido é interessante apontar convergências e dissidências entre o ato solidário da virtude elencado por Spinoza e a compaixão cristã, apontada de certa maneira como vício pelo autor, por se tratar muitas vezes de uma estrutura passiva, enquanto o seu entendimento de compaixão passa pelo posicionamento e aplicação ativos.
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O cristão sente, o spinozista pensa.

O resultado prático é o mesmo, mas o princípio norteador difere drasticamente, resultando sim em outro tipo de mobilização e “energia” metafísica, apesar de os atos palpáveis se assemelharem. Em Spinoza há conexão entre os pontos fortes e positivos dos envolvidos, que se solidarizam pela esfera dos valores/recursos. Já no Cristianismo há uma identificação com a dor, com o sofrimento alheio, sendo o ponto-de-contato então a esfera da penúria. Ressalta-se que ambos, com foco e determinação, atingem seus objetivos à sua maneira e à sua esfera.

Vale pontuar aqui a ação compassiva, a nomenclatura e os conceitos budistas. Em termos de nomenclatura o budismo utiliza o mesmo que o cristianismo, compaixão, mas a aplicação prática é mais próxima ao entendimento spinozista de solidariedade, como vimos no terceiro e quarto parágrafos acima.

O budista age.

A compaixão é termo importante dentro da filosofia budista, sendo uma das 4 qualidades incomensuráveis – junto com amor, regozijo e equanimidade. Mas que compaixão é essa?

No budismo ensina-se a identificar o sofrimento, a dor e, conseqüentemente a necessidade alheia, sem contudo se esquecer do potencial daquele indivíduo. Orienta-se a não identificar-se com os aspectos negativos e redutores de potência justamente para se ter força para auxiliar de verdade o próximo a superar seus obstáculos – trabalha-se o não-apego com amor incondicional, resultando em uma boa explicação do que o termo compaixão significa no budismo: Sensibilizar-se com a questão alheia, mas não a ponto de enfraquecer-se ou perder o prumo da razão. Assim consegue-se ter o direcionamento com a força necessária, sendo efetivamente útil.

Isto apenas os fortes e emancipados conseguem; portanto poder-se-ia afirmar tratar-se da precisa união entre o que há de melhor em ambas abordagens: racional-spinozista e sentimental-cristã; a força do primeiro e o direcionamento sensível do segundo.

Apesar de Spinoza ter definido a distinção entre os conceitos e aparentemente ser o elo de união entre as diferenças-complementares das compaixões de budistas e cristãos, como vimos acima, tanto a sua razão quanto o sentimento cristão podem existir sem serem vivenciados; vale lembrar que o budismo confere importante papel à mente e à razão, todavia estas não são totalitárias, necessitam do equilíbrio com o coração e o sentimento para serem colocados em prática e simplesmente fluirem.

O budismo estabelece assim um novo conceito, reconstruindo o conceito compaixão de maneira mais forte e ampla: o budista pensa como Spinoza – neste caso ao menos –, sente como o cristão – sem contudo se identificar –, mas age compaixão – um traço do conceito de interdependência, que nos lembra que estamos todos interconectados com tudo: se agirmos com-paixão, comungaremos de determinado momento e sentimentos, receberemos o retorno daquilo que aplicamos após ter planejado racionalmente; compaixão enquanto não-conceito, vivenciado na prática sustentada pela razão e pelo sentimento.

O budismo busca o não-conceito justamente para poder fazer uso desta arma como um todo e assim atenuar possíveis falhas contidas em duas estruturas estanques e separadas. Como não-conceito entendemos, com o auxílio do livro “A Essência dos ensinamentos de Buda”, do monge vietnamita Thich Nhat Hanh que:

“Praticar é ir além das idéias, para chegar à coisa em si. A não-idéia é o não-conceito. Enquanto houver uma idéia, não haverá realidade nem verdade. A expressão "não-idéia" na verdade significa a não existência de idéias ou de conceitos errôneos. Não significa ausência de atenção plena. Por causa da atenção plena, nós sabemos quando algo está errado e quando algo está certo.”

“Atenção plena nos ajuda a identificar todas as sementes que jazem em nossa consciência armazenadora e regar apenas aquelas que são saudáveis.”

Daí o budista agir, enquanto o cristão sente e o spinozista pensa: o budismo prega a prática no equilíbrio da mente-coração, entre o sentir e o pensar. Mesmo que para Spinoza pensar seja agir, a vivência cotidiana nos comprova que nem sempre ocorre tal transposição. Lao Tse, filósofo chinês, ícone taoísta e influenciador do zen budismo afirmava que “saber e não fazer, ainda é não saber”. Podemos completar o pensamento com a afirmação de que sentir e não fazer, ainda é não sentir.

Pensamentos e sentimentos podem ser destrutivos – apenas a prática transmuta a energia criada e acumulada.

É importante ressaltar as questões semânticas relacionadas aos diversos usos do termo compaixão, bem como a aplicação de cada conceito de acordo com as características culturais. Enquanto no ocidente as paixões são tidas como um entrave ou possível problema para grande parte dos filósofos, que as consideram em grau menor do que a razão e o amor – explicitando-se aqui que para Spinoza, diferente da maioria dos demais filósofos, o amor envolvendo a idéia de uma causa exterior é paixão, o que torna esta afirmação última, no tocante ao amor, inviável –, para os sábios tibetanos, entretanto, as paixões são usadas como meios para a prática, sendo sua energia canalizada e utilizada na evolução pessoal e coletiva.

Já sobre a nomenclatura, vimos no primeiro parágrafo como Spinoza aproxima compaixão de comiseração e elucidamos os possíveis desdobramentos relacionados ao radical da palavra e sua conseqüente compreensão negativa. Mas isso não ocorre apenas na escolha do latim e na interpretação do português. Em alemão a palavra compaixão é muitas vezes traduzida como “Mitleid” cuja tradução ao pé da letra é “sofrer com” e, portanto, se assemelha muito à compreensão cristã do que possa vir a ser compaixão. Para Spinoza deveria ser algo mais para “Mitwachsen”, “crescer com”. Para os budistas, poderia ser “Ohneleid”, “sem sofrer” ou, melhor ainda, “dazu stehen”, “junto de pé”, pois acreditam poder extirpar do próximo toda dor, sem contudo sofrer com isto.

No ocidente – valendo tanto para os cristãos, quanto para Spinoza quando usa o termo commiseratio -, compaixão tem nas palavras “comiseração”, “piedade”, “dó”, “misericórdia” e “pena” seus melhores sinônimos. Já no Tibete, por exemplo, o Buda da Compaixão também é chamado de Buda da Compaixão Infinita, Buda do Amor Infinito, e compaixão denota comunhão de sentimentos. Isto mostra as diferenças de abordagem e, como vimos, uma redefinição de compaixão a partir do ‘conceito-na-prática’ Budista, deixando-o mais forte e amplo.

Fato é que para as 3 linhas de entendimento do que seja compaixão ou o ato de prestar auxílio racionalmente, o resultado é idêntico: capacidade de auxiliar o próximo a cessar o sofrimento e a melhorar. Há certamente uma discrepância na conceituação da palavra, mas não há dúvidas sobre o fato de a erradicação do sofrimento alheio – independente de seu método - só poder ser obra de uma pessoa forte.
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Com agradecimentos especiais à professora Alice Bitencourt Haddad - do curso de pós-graduação em filosofia do Mosteiro de São Bento/RJ - que me introduziu ao pensamento spinozista e não apenas avaliou e validou, mas deu importantes diretrizes a este texto.
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No Amor,